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N° 6 - Freud entre nós

Diversos

A morte de Freud, ocorrida a 23 de setembro de 1939, ao tempo em que priva o mundo do convívio com sua aguda inteligência,...

R$ 16,50

Sumário

Parte I

Brief an Romain Rolland (Eine ErinnerungBtörung auf der Akropolis)
S. Freud
Carta a Romain Rolland (Uma perturbação da lembrança na Acrópole)
S. Freud
Um encontro singular com a Acrópole
Eduardo Vidal
O desmentido no campo do Outro
Ana Maria Portugal Saliba

Parte II

Jakob, o Nome do Pai e outros pais
Ari Roitman
Depois de Freud
Paulo Becker
Freud e a literatura
Claudia Moraes Rego
Dois tempos na obra de Freud
Myriam Rodrigues Fernández
Homenagem a Freud
José Carlos Lima e Mauro Rabacov

Parte III

Sobre a interpretação dos sonhos
Cora Vieira
Por que a guerra?
Leny Andrade e Rossely S. M. Peres
Uma leitura de Análise terminável e interminável
Elisabeth Tolipan
Considerações sobre Mal-estar na civilização
Maria Cristina Vidal
Moises e o monoteísmo: uma leitura
Maria Lessa Barreto
Comentários sobre A clivagem do eu no processo de defesa
Renato R. P. de Carvalho

Apresentação

A morte de Freud, ocorrida a 23 de setembro de 1939, ao tempo em que priva o mundo do convívio com sua aguda inteligência, seu magnetismo pessoal e seu brilhante espírito crítico, sela – para sempre – a permanência operativa, criativa, daquilo que foi sua produção e seu legado é a psicanálise.

Os significantes por ele forjados – inconsciente, desejo, pulsão, recalque, transferência e tantos outros – tornaram-se verdadeiros operadores teóricos que permitem, e permitirão, dar conta da experiência humana no que ela tem de menos palpável: a determinação de um Outro que nos fala, isto é, fala em nós apesar e à revelia de nós mesmos. Depois de Freud, o homem “já não é mais amo em sua própria casa”.

A subversão freudiana, que vai de encontro ao bom-senso e ao espírito científico da época (a sua? a nossa?), baseia-se num paciente trabalho de garimpo, entre os refugos da experiência cotidiana desprezados pela consideração dos “sábios” – sonhos, esquecimentos, lapsos, etc. -, à cata da pedra refulgente por seu conteúdo de Verdade.

A diferenciação do psíquico entre o consciente e o inconsciente é o verdadeiro schibolet, premissa fundamental da psicanálise, diz Freud em 1923. Divisão do sujeito que, como traço distintivo, delimita com nitidez o campo freudiano.

Mas como conceber esse “misterioso” inconsciente? A ontologia mostra-se desarmada frente a esses fenômenos que surgem e de imediato desaparecem, numa pulsação temporal em que o desvanecimento é a regra.

Em 1956, numa conferência dedicada ao centenário do nascimento de Freud, já observava Lacan: “A originalidade de Freud, que desconcerta nosso sentimento, mas por si só permite compreender o efeito de sua obra, é o recurso ao literal. É o sal da descoberta freudiana e da prática analítica.”

Pois bem. Literal quer dizer: ao pé da letra. E mesmo que a letra não tenha pé, e muitas vezes o enunciado, nem pé nem cabeça, a articulação significante cria permanentemente desconcertantes efeitos de sentido que aturdem, perturbam e apontam a irrupção do desejo onde menos se o espera.

Define-se assim uma sorte de estranha materialidade do inconsciente, isto é, seu estofo cujo material é o significante (que Freud chamou de Vorstellungsrepresentanz) e cujo estatuto é o das leis do processo primário, condensação e deslocamento (análogas aos tropos que constituem os dois eixos da linguagem, metáfora e metonímia).

Mas é também o próprio Freud quem indica um além do inconsciente, ponto de resistência intocado pela palavra. É o que chamou de trauma, de umbigo do sonho, de além do princípio do prazer e de tantos outros nomes que tentam dar conta daquilo que, jamais ingressado no domínio da representação, define um mal-estar estrutural no horizonte do humano. Nomes que apenas traçam o contorno – realizando-o, num movimento de aprés-coup – do buraco onde habita o silêncio da pulsão de morte, lugar do gozo indizível.

A grande marca do pensamento freudiano, então, é a concepção radical do homem como portador, a um só tempo, da palavra e do corpo à alquimia heterogênea entre gozo e significante que o condena a uma inexorável divisão.

Aos praticantes da psicanálise – analistas, analisantes – cabe trabalhar (com) essa divisão. Foi o que fez Freud diante da Acrópole, trabalho de divisão cuja resto é a carta a Romain Rolland que aqui publicamos. Foi também o que Freud fez ao postular, no fim de sua vida, o conceito de Ichspaltung (legível como spaltung, rachadura do sujeito), contrapondo-se assim – de antemão – aos epigonos da harmonia e da completude.

Trata-se, antes que de questão teórica, de uma postura ética: o princípio do prazer visa à homeostase da excitação, portanto a uma constância que define propriamente o bem-estar. Para além, está o lado obscuro da experiência humana, o ser pulsional cujo objeto (há?) opera como causa e fundamento do desejo. É o que a psicanálise deve sustentar.

O legado freudiano é teórico, clínico, ético – admite, bem o sabemos, incontáveis pontos de abordagem. Abordá-los, interrogá-los e aprofundá-los – a tarefa daqueles que pretendem manter vivo o trabalho de Freud e dele continuar extraindo todas as consequências possíveis, ainda hoje, 50 anos após a sua morte.

Eis o propósito da Letra Freudiana ao titular este sexto número “FREUD ENTRE NÓS”, título que também serviu de insígnia à semana comemorativa do cinquentenário dessa morte. Os trabalhos aqui publicados (com exceção, naturalmente da tradução do referido texto freudiano) foram apresentados naquelas reuniões, entre 18 e 23 de setembro de 1989. Alguns deles passaram pelo processamento próprio da escrita; outros conservam o sabor…

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