“ (…) Sigo os passos,
Passo a passo.
e fundo outro caminho.

Sigo os passos.
Passo a passo.
Sigo e passo.
As águas passam,
e as pedras ficam…”

(Conceição Evaristo: No meio do caminho: deslizantes águas)

Não há como escrever a realidade: a realidade escapa, a realidade é incompreensível… quando você vive um fato e fala desse fato, a sua fala já modifica o fato. A literatura é isso tudo: é a realidade, é a modificação do fato, é a ampliação do fato… é a diminuição do fato. Se a palavra oral não dá conta de dizer do que se passou – imagina a palavra oral…, a oralidade tem o corpo: os seus olhos falam. Se você é mais vivo, percebe inclusive que a pessoa tá mentindo.

 Então eu falo: eu quero escrever a ficção como se eu estivesse escrevendo a verdade. Como se eu tivesse escrevendo a realidade, mas sei que não dou conta. Tento me aproximar o mais possível. E o que vai me permitir aproximar o mais possível – e alguém dizia também, um menino falou: “como é que a senhora consegue escrever uma cena tão bruta e fica tão poético?”. É o trabalho da linguagem. É esse trabalho, a linguagem. Eu acho que essa cata da palavra…, quando eu não consigo a palavra, eu invento… eu aglutino… é o exercício da linguagem. [Leia +]