Uma carta inteira. Uma palavra seguindo a outra, quantas palavras? Mandar carta para uma pessoa que não sabia ler, só sendo. A ponta do lápis pairou acima da linha. O próximo nome tinha escrito a carta cinquenta e dois anos antes. Ao lado do caderno, o envelope encruado, sempre fechado. Raimundo não deixou ninguém ler e envelheceu com o desejo de saber o que ela diz crescendo dentro dele. Feto idoso, rebento tardio. A carta guardava uma vida inteira[1].

Lugar tem o prazer de receber o escritor Stênio Gardel, autor do livro A palavra que resta

Quarta-feira, 26 de abril de 2023, às 20h45

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Esticador de horizontes, a professora Ana explicou que na poesia uma palavra diz muito mais do que diz, é a palavra que se estica então, isso sim, onde a palavra sozinha não vai, com a poesia vai, voa, que nem os passarinhos, passarinho que escuta de longe o silêncio que é tão alto, silêncio alto, abrir amanhecer, encolher rio, esticador de horizontes, só a palavra mesmo! e eu tenho que usar as minhas palavras pra fazer a redação que ela pediu sobre a poesia, trabalho de fim de ano, escrever tanto de uma vez só, mas precisa ser muito longo não, dez, quinze linhas, ela disse, é o que eu achei da poesia, o que eu senti com ela, nunca tinha nem ouvido poesia como essa, mas tem palavra que a gente escuta na vida que parece poesia, se as palavras se esticam e esticam o horizonte da gente, Tu quer aprender a ler e escrever, Gaudêncio? te ensino, estou aprendendo, Cícero, tu aumentou o meu poente, mas depois pintou ele de um encarnado grande demais, um encarnado encarnado demais que o pai riscou nas minhas costas, imundo, tem palavra que faz é o contrário também? encolhe e escurece a vista da gente, vermelho coagula em preto[2].

Até lá!


[1] Gardel, S. A palavra que resta, p.12.

[2] Ibid, p.59.

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