[…] trabalho com a suposição de que nosso mecanismo psíquico tenha surgido de uma sobreposição de camadas, na qual, de tempos em tempos, o material presente na forma de rastros mnêmicos sofre uma reorganização, uma reescrita
Freud, “Carta 52”

 

Não imaginamos a que ponto se rateia na escrita. O lapsus calami não é primeiro em relação ao lapsus linguae, mas pode ser concebido como o que toca o real.
Lacan. O sinthoma

A partir do horizonte esboçado por Freud a respeito da escrita pictográfica nos sonhos, Lacan destaca que o sintoma pode ser lido por se inscrever em um processo de escrita. O aparelho psíquico freudiano prenuncia a superfície de escrita que se produz na experiência analítica se esta não se reduz à primazia do simbólico.

Se a verdade provém do real e tem uma estrutura de ficção, isto não quer dizer que a ficção construída numa análise seja, a princípio, da mesma dimensão ficcional do campo das artes. A escrita que a suporta vem de um lugar diferente daquele do significante, é algo que tangencia o real. A letra que aí se escreve faz borda ao buraco no simbólico e não é da ordem das letras literárias ou mesmo lituraterrais. Trata-se de uma outra escrita.

Como ensaiar uma articulação com aquele escrito obtido por meio da caneta, teclado, pincel, estilete, cinzel ou mesmo pelo cinematógrafo? Trata-se da tentativa – a partir destas manifestações no campo das artes – de rastrear, demarcar na contingência, pontos de opacidade que sugerem alguma aproximação ao real: uma certa passagem à escrita do que não para de não se escrever.

 

Francisco José Bezerra Santos

Fortaleza/CE – Mensal, sábados às 10h30 (datas a combinar)