Frente aos acontecimentos que enlutam o Rio de Janeiro e o Brasil, a Escola Letra Freudiana vem expressar seu decidido questionamento aos atos de barbárie perpetrados nas operações do dia 28 de outubro. A declaração de ‘guerra’ emitida por um governo estadual busca justificar uma das intervenções mais graves da história do país, ferindo de morte a população de comunidades afetadas por uma crueza da qual é difícil se recuperar.

Sabemos que o real do extermínio reaparece em formas violentas de segregação: um apelo à vingança e ao esquecimento com a exibição de corpos sem nome, como dejetos, reduzidos a números. Isso não deve ser esquecido, isso precisa ser tratado de modo simbólico com a inscrição dos nomes, a responsabilidade dos executores, a produção de uma memória ativa. A dimensão trágica do acontecido, na medida em que se pretenda apagar o traço de memória, inexoravelmente reaparecerá como repetição mortífera.

A Escola Letra Freudiana ouviu e recebeu nesses dias as manifestações de outros espaços da psicanálise, de artistas e trabalhadores da cultura, de amigos com os quais partilhamos experiências de trabalho. O que mostra o que já sabemos: nem toda a sociedade se esconde atrás da indiferença ou no silêncio que pretende calar práticas letais. O crime – Lacan o enunciara nos anos 30 – nunca é apenas individual. Ele compromete os participantes do tecido social que ele esgarça, apontando para o lugar de cada um na responsabilidade coletiva: o que é forcluído, excluído do simbólico – a violência sem marca e sem nome – irrompe no real do laço social, destruindo os enodamentos da vida com o corpo simbólico.